quarta-feira, 13 de março de 2024

Encantado's e a falência do modelo de TV aberta

 
     
    Estreou ontem na GloboPlay a segunda temporada da série Encantado's, que conta a história do dia a dia de um pequeno mercado no bairro de Encantado, zona norte do Rio de Janeiro. O que diferece esse mercadinho de vários outros na Cidade Maravilhosa e na ficção de modo geral é que após o expediente as prateleiras se arrastam e ali funciona o barracão de uma escola de samba, que luta para alçar voos nas divisões de acesso do Carnaval carioca. 

    Eu não assisti ainda a segunda temporada, mas vi a primeira recentemente, próximo ao feriado do Carnaval e me encantei (peço desculpas pelo trocadilho) com a série como um todo. Os personagens são muito variados e suas histórias cativam demais o telespectador, indo desde as clássicas histórias de amor até a superação dos bloqueios criativos que todo artista eventualmente passa; o enredo da trama é muito leve, podendo ser acompanhado por quase que qualquer público e trás elementos muito populares do dia a dia do brasileiro, como o trabalhar em mercado (quem nunca trabalhou ou não conhece alguém que trabalha) e o participar da grande festa nacional em fevereiro. Por fim, conta com um elenco majoritariamente composto por atores negros, o que, nas demandas da sociedade atual, é uma grande dedada na ferida, só que sem a militância gratuita que a gente tanto vê em obras que tentam incluir a todo custo minorias em seu casting. O típico "papel de negro", que é aquele do personagem que só existe na narrativa para sofrer racismo, não está presente ali. São pessoas pretas que vivem seu dia a dia normalmente e a temática do preconceito pode eventualmente aparecer, mas está longe de ser o tema principal da história. 

    Quando eu terminei de assistir Encantado's a primeira coisa que me veio na cabeça é:

"Essa é uma das séries mais TV aberta que eu já assisti na minha vida."

    E de fato, veja tudo que eu disse acima. Encantado's é um produto que deveria sim estar toda semana na nossa telinha, nos fazendo companhia depois da novela ou em qualquer outro horário que a Globo decidisse. E por que não está?

    Eu pensei, pensei, pensei e cheguei à conclusão de que talvez uma série aos moldes de Toma Lá Dá Cá, A Diarista ou Mister Brau não se encaixa mais no nosso modelo atual de TV, que a cada dia perde mais público e mais anunciantes para os conteudos "on demand", que pode-se ser visto na hora em que se quer  que é o que o streaming oferece. Basta você pensar, pra que fazer 32 episódios anuais de uma série, com dia e horário marcado, se existe a possibilidade de fazer apenas 12 e soltar na internet? E isso sem nenhuma reclamação de público? Pra que contratar um elenco para um ano todo, se esse mesmo elenco pode atuar como freela por dois meses e depois ser recontratado novamente por mais poucos meses? O modelo de TV que tínhamos anos atrás, ao menos aparentemente, se encaminha para seu final ou para uma mudança muito brusca. Eu particularmente acredito na segunda opção, mas independente de qual dessas duas for de fato rolar, pode-se ter certeza de uma coisa: em nenhuma delas o caminho será menos dolorido. 

    E para encerrar você pode argumentar que a Globo já passou essa série em TV aberta. E sim, é verdade. Você inclusive pode ver o trailer abaixo. Mas entenda, por mais que ele tenha passado na TV, ele não foi feito para passar na TV. Ou ao menos não na TV da forma como a gente gostaria que fosse feito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário