domingo, 7 de maio de 2017

AtleTiba na internet



arte: Lucas R. F. Maester
É de se imaginar que em "dias normais" eu jamais viria aqui pra falar do Campeonato Paranaense, né (na verdade, hoje seria pouco provável que eu viesse aqui falar de qualquer estadual)? Mas este contou com um diferencial, uma revolução. Dois times mostraram que talvez (leiam bem, talvez) dê para acabar com a dependência de TV no futebol brasileiro. 



A RPC, afiliada Rede Globo no Paraná, confirmara o acordo para poder transmitir o estadual local, organizado pela Federação Paranaense de Futebol (FPF), como já é o comum de todos os anos. Surpresa nenhuma, não fosse um detalhe: a declinação de Atlético Paranaense e Coritiba, os dois maiores clubes do estado. CAP e Coxa resolveram não assinar com a emissora após esta ter oferecido valores absurdamente baixos pela exibição de seus jogos. A solução encontrada para isso seria algo inédito no futebol brasileiro: o embate entre os dois times (o "atletiba") seria transmitido de forma exclusiva pela internet. Sem intermediação direta de TV, toda a transmissão seria de responsabilidade dos clubes. Os canais no YouTube e as páginas do Facebook das duas equipes mostrariam simultaneamente o clássico do dia 19 de fevereiro de 2017, pela quinta rodada do torneio, direto da Arena da Baixada. 
Chegado o domingo da partida, tudo estava pronto. Público no estádio, repercussão positiva no país todo (a iniciativa deu muito o que falar) e com o  Esporte Interativo mostrando as garrinhas - já de olho em 2019, era hora de fazer história. Mas o jogo não aconteceu. A Federação interferiu a fim de parar o derby com os jogadores já posicionados para o apito do juiz. A alegação era uma suposta falta de credenciamento do pessoal de imprensa, justificativa, que óbvio não colou, e acusações contra a Globo não demoraram a aparecer. Campo e internet tornaram-se uma zona de guerra. Investigações sobre o que "realmente aconteceu" naquele fatídico dia seguem até hoje em tramitação nos órgãos de justiça, então até por isso, não cabe a mim, autor deste blog, dar sentença de culpa ou inocência neste episódio, mas uma coisa é certa, a partida que por si só já seria histórica, terminou de vez nos anais (não se exaltem) do nosso futebol. O jogo foi remarcada para o dia primeiro de março e ocorreu normalmente. Foi visto através das mídias sociais das equipes.
Campeonato após isso seguiu sem incidentes, mas quisera o destino que os mesmos dois times chegassem à final. A solução, logo, não podia ser outra, e as duas partidas decisivas seguiram o mesmo esquema de exibição. Primeira decisão de título de um campeonato profissional de futebol no Brasil sendo mostrada apenas pela internet! É pouco ou quer mais? 



Mas o que eu acho disso tudo? As primeiras partidas tiveram ótimos números de audiência. Tão bons que eu mesmo fiquei surpreso. Mas claro, não precisam me dizer que a transmissão pela TV geraria um alcance muito maior - ainda mais em uma decisão de título -, mas só pelo fato de sabermos que muitas pessoas, em especial as mais velhas, ainda não tem acesso a serviços informática no Brasil (nem para conseguir acessar as mídias, ou até sequer para ficar sabendo da "novidade") e de que a torcida destes dois times ainda é consideravelmente pequena (média, pode ser?) - em comparação às dos "grandes clubes", ver que o clássico ultrapassou com folgas a casa dos milhões, é algo pra lá de gratificante. Mas por ora, infelizmente, não vejo tanto futuro pra esse tipo de prática - apesar de acreditar que o jogo ainda possa virar. O modelo é novidade, dá pra se explorar muitos meios de se fazer dinheiro através dele (leia a matéria que acabei de deixar anexada em verde), e até vale ressaltar, várias inserções comerciais foram notórias nas finais, o que é um ótimo retorno para a empreitada, mas, para o bem ou para o mal, o futebol brasileiro ainda é muito dependente de televisão. E historicamente, muito pouco foi feito para se reverter isso. O próprio Coritiba, para servir de exemplo, teve mais da metade de sua receita advinda apenas da Globo em 2016 (o Atlético está na casa dos 34%, mas com uma crescente absurda de 2015 pro ano passado. A pesquisa está linkada no texto). Sinal de que nosso futebol está valorizado na telinha? Sem dúvidas. Depois dos incidentes das últimas negociações de exibição (dissolução do Clube dos 13 em 2011 e a chegada da Turner, através do Esporte Interativo, para 2019), o campeonato super que encareceu - ou simplesmente inflacionou mesmo -, porém, dá pra analisar por outros lado também: não haveria uma enorme falta de vontade da maioria dos clubes para lucrar a partir de outras fontes? Basta se lembrar de que sócio torcedor, projeto que hoje dá certíssimo para algumas equipes, é algo novo, mas e antes disso, o que acontecia? Esperava-se lucro de bilheteria ou um boom de venda de camisas? É até difícil de conseguir uma resposta.
A iniciativa de se livrar das amarras, injustas sim, diga-se de passagem, do grupo que detém o monopólio do futebol no Brasil é muito legal. Mais do que isso, é um direito dos times, mas eles que não se esqueçam de que se uma extremidade da corda começou a ficar mais pesada, é porque faltou reforço na outra. Tempos e mídias mudaram, é hora de se reinventar, isso é fato, mas muito cuidado, que um "lado da corda" está em larga desvantagem, e sabemos muito bem qual é. 



As partidas de Atlético-PR e Coritiba pelo Campeonato Paranaense de 2017 transmitidas exclusivamente na web estão distribuídas no corpo deste texto, pela ordem de realização.

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